2019-2028 A Década das Nações Unidas para a Agricultura Familiar
A agricultura familiar contribui para ampliar a sustentabilidade ambiental, preservando e restaurando a biodiversidade e os ecossistemas, ao mesmo tempo que fornece alimentos tradicionais e nutritivos que contribuem para dietas equilibradas e preservam o património cultural nas áreas rurais. No dia 29 de maio, em Roma, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e o Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA) realizaram o lançamento oficial da Década das Nações Unidas para a Agricultura Familiar 2019-2028.
A Década das Nações Unidas para a Agricultura Familiar tem como objetivo concentrar os esforços da comunidade internacional para trabalhar coletivamente na formulação e implementação de políticas sociais, económicas e ambientais voltadas à criação de um ambiente propício ao fortalecimento da agricultura familiar em todo o mundo.
Durante o evento, que contou com a presença de representantes de governos, de organizações da sociedade civil e académicas, de produtores e do setor privado, decorreram sessões de intercâmbio de conhecimento entre agricultores e diálogos regionais sobre as prioridades na construção de uma agenda sólida e multiparticipativa alinhada com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
“O Plano de Ação destaca não apenas o problema da fome, que está a aumentar, mas também o problema da obesidade crescente. Precisamos de prestar atenção à obesidade. Sabemos o que temos que fazer para combater a fome, mas não o suficiente sobre o combate à obesidade. Os agricultores familiares são os que produzem alimentos locais frescos e de forma sustentável. Essa é a sua contribuição”, expressou José Graziano da Silva, Diretor-Geral da FAO no lançamento da Década em Roma.
O Plano de Ação Global fornece uma orientação detalhada para a comunidade internacional sobre ações coletivas e coerentes que podem ser tomadas durante o período 2019-2028. Destaca a necessidade de aumentar, entre outros, o acesso dos agricultores familiares a sistemas de proteção social, finanças, mercados, formações e oportunidades de geração de rendimento.
Numa carta lida no lançamento, o Papa Francisco expressou: “O emprego de jovens na agricultura, além de combater o desemprego, pode trazer novas energias para um setor que está a provar ser de importância estratégica para os interesses nacionais de muitos países. Os Objetivos da Agenda 2030 não podem ignorar a contribuição dos jovens e sua capacidade de inovação.”
A agenda da Década pretende chamar à atenção ao facto de que os agricultores familiares produzem mais de 80% dos alimentos consumidos no mundo e, paradoxalmente, frequentemente se encontram entre os grupos populacionais mais vulneráveis à insegurança alimentar.
Em entrevista ao Escritório da FAO em Portugal junto com a CPLP, Sara Rocha, representante do Mecanismo de Facilitação da Participação da Sociedade Civil no Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (MSC–CONSAN–CPLP), expressou que a Década para a Agricultura Familiar é uma iniciativa muito pertinente, na medida em que a sua declaração traz possibilidades de cooperação e de mobilizar apoios estratégicos para apoiar processos em curso, como por exemplo, a Declaração dos Direitos dos Camponeses.
FAO: Qual é o significado da Década das Nações Unidas para a Agricultura Familiar para o trabalho de implementação da Estratégia de Segurança Alimentar e Nutricional da CPLP?
SR: Para os países da CPLP, a Década para a Agricultura Familiar pode ser também uma janela de oportunidade, para se aprofundar o trabalho que tem sido feito, no sentido das Diretrizes para a promoção da agricultura familiar, que foi um marco institucional e legal importante, um compromisso estabelecido pelos Estados-Membros que, no entanto, a nível nacional de cada país, carece ainda de criação de medidas concretas, sejam em termos de leis nacionais, registo dos agricultores e operacionalização do cadastro para agricultura familiar.
FAO: Qual será o papel da sociedade civil e da Plataforma de Camponeses da CPLP na implementação da Década?
SR: Os agricultores devem ser os protagonistas da Década. A nível da CPLP, diversas organizações da sociedade civil, de agricultores e camponeses estão reunidas no Mecanismo para a Facilitação da Participação da Sociedade Civil do CONSAN-CPLP. No âmbito do CONSAN, existe um Plano de Atividades bienal para 2018-2020 que inclui a implementação da metodologia participativa dos Sistemas Importantes de Património Agrícola Mundial (SIPAM) e a realização de intercâmbio entre agricultores sobre tecnologias agroecológicas. Estas atividades têm com objetivo promover práticas de produção e de sistemas alimentares sustentáveis, ao mesmo tempo que visa garantir que as práticas já existentes sejam reconhecidas como sustentáveis.
FAO: E no que a Década para a Agricultura Familiar pode vir a contribuir?
SR: O ideal será que esta década seja um “chapéu maior” que permita mobilizar mais oportunidades de cooperação e de parcerias estratégicas para dar força a processos que já estão em curso e gerar outros que possam ser benéficos para o trabalho da valorização da agricultura familiar. Por outro lado, ao enquadrar dentro dos objetivos uma visão de transição dos sistemas alimentares, há um foco de relacionar a agricultura familiar com as questões da nutrição, do consumo e do contexto socioeconómico.
FAO: Pode contar-nos um pouco sobre o processo de organização da sociedade civil em torno da Década?
SR: Em março, a VI Conferência Global do Fórum Rural Mundial teve como tema “Uma Década para melhorar a vida dos agricultores familiares”. A Conferência teve lugar em Bilbao, Espanha, e serviu como plataforma de discussão para a contribuição da Agenda Oficial da Década para os níveis nacionais, regionais e global, contribuindo diretamente para o Plano de Ação da Década da Agricultura Familiar.
Ações do Plano de Ação Global para a Década da Agricultura Familiar:
- Desenvolver e implementar um ambiente político favorável (incluindo políticas abrangentes e coerentes, investimentos e estruturas institucionais) que apoiem a agricultura familiar nos níveis local, nacional e internacional;
- Apoiar a juventude e as mulheres rurais, permitindo-lhes aceder a recursos produtivos, recursos naturais, informação, educação, mercados e participar em processos de elaboração de políticas;
- Fortalecer as organizações de agricultores familiares e suas capacidades para gerar conhecimento e vincular conhecimentos locais (tradicionais) específicos a novas soluções;
- Melhorar os meios de subsistência dos agricultores familiares e aumentar a sua resiliência a múltiplos riscos através do acesso a serviços sociais e económicos básicos, bem como facilitar e promover a diversificação da produção para reduzir os riscos e aumentar os retornos económicos;
- Promover a sustentabilidade da agricultura familiar para sistemas alimentares resilientes ao clima e o seu acesso, gestão responsável e uso da terra, água e outros recursos naturais.