Requisitos legais e de bem-estar no transporte de bovinos
É cada vez mais frequente a sociedade não ver a produção animal como simples fonte de alimento, mas valorizar sobretudo a qualidade e segurança alimentar, largamente diversificados, proporcionando melhor proteção do ambiente e preservação das paisagens rurais, bem como animais bem tratados, quer na Exploração, como durante o transporte e abate.
A forma como os animais são transportados afeta significativamente a sua saúde e bem-estar, bem como a qualidade do produto final. Como princípio geral, os animais não devem ser transportados em condições suscetíveis de lhes causar dor ou sofrimentos desnecessários.
A nível comunitário e nacional existe uma vasta base legal relativa à proteção dos animais no transporte. A legislação em vigor, em matéria de proteção dos animais, proíbe o transporte de animais que não se encontrem aptos para esse efeito, responsabilizando e punindo os produtores pecuários e os transportadores que movimentem animais nessas circunstâncias.
Paralelamente, porque a produção animal é uma atividade da qual decorrem importantes implicações para a saúde pública e cuja rentabilidade importa salvaguardar, é necessário criar mecanismos que permitam viabilizar o aproveitamento da carne de animais que sofrem acidentes, com vista à sua comercialização, em condições adequadas de higiene e segurança alimentar.
Os requisitos de transporte dos animais para o matadouro, assim como o maneio pré-abate influenciam, significativamente, tanto a qualidade higiénica da carne como a sua capacidade de conservação. Os principais indicadores de perturbação do bem-estar animal durante o transporte são a mortalidade, os traumatismos e a qualidade da carcaça.
Legislação
A proteção e o bem-estar animal, nomeadamente, ao nível das Explorações, transporte e abate estão salvaguardados pela legislação comunitária e nacional, que fixa um conjunto de regras mínimas que devem ser aplicadas e respeitadas por todos aqueles que cuidem dos animais, quer sejam proprietários ou tratadores.
Havendo a necessidade de proteção dos animais vivos durante o transporte, a fim de minimizar a possibilidade de lesões, ferimentos e sofrimentos desnecessários, foi criado o Regulamento nº 1/2005 de 22 de dezembro de 2004 e o Decreto-Lei nº 265/2007 de 24 de julho, alterado pelo Decreto-lei nº 158/2008 de 8 de agosto, que estabelece as obrigações dos transportadores, organizadores e detentores no transporte dos animais.
- Assim, não obstante os demais requisitos técnicos e/ou requeridos em legislação própria, deve ser assegurado que:
- Os animais estejam aptos a fazer a viagem prevista;
- A viatura esteja equipada com proteções laterais suficientemente altas e resistentes para evitar queda ou fuga dos animais. Estas proteções devem ser de material facilmente higienizável;
- Os animais sejam carregados e descarregados de forma segura, podendo recorrer ao uso de rampas com proteções laterais;
- Seja permitida a utilização de uma cabeçada sempre que for necessário fazer contenção do animal. É proibido prender os animais pelos cornos, argolas nasais e pelas patas amarradas conjuntamente. Sempre que os animais tenham de ser contidos os meios utilizados deverão ser:
- Suficientemente fortes para não cederem em condições normais de transporte;
- De forma a permitir aos animais, se necessário conseguirem deitar-se;
- Concebidos de forma a eliminar qualquer risco de estrangulamento ou ferimento e a permitir que os animais sejam rapidamente libertados.
- O piso da viatura seja antiderrapante;
- Garanta a presença de uma cama na caixa de carga da viatura que minimize os derrames de urina e fezes;
- O transporte seja efetuado sem demora até o local de destino;
- A limpeza e desinfeção da viatura seja realizada imediatamente após a descarga dos animais;
- O pessoal que manuseia os animais possua experiência e/ou competências adequadas para esse fim e desempenhe as suas tarefas sem recurso à violência ou a qualquer método suscetível de provocar medo, lesões ou sofrimento desnecessários;
- Seja colocada uma placa indicativa da presença de animais vivos na viatura utilizada para transportar os mesmos.
Todos os transportadores de animais vertebrados vivos, que efetuam transportes relacionados com uma atividade que tende a produzir lucro (transporte de animais com fins comerciais), como é o caso dos bovinos, têm que estar registados e autorizados pela Direção Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV) para esse efeito.
Aptidão dos animais para o transporte
O transporte de animais envolve não apenas os transportadores, mas também outras categorias de operadores tais como: agricultores, comerciantes, agentes dos matadouros, onde todos, em especial os que manuseiam os animais durante o transporte, devem possuir formação adequada e competência apropriada para este fim, para que forneçam os cuidados necessários e recomendados aos animais transportados, sem violência, nem atos que provoquem medo, lesão ou sofrimento, proporcionando condições de bem-estar adequadas. É proibido bater ou pontapear os animais, aplicar pressões em partes especialmente sensíveis dos animais, que lhes provoque dor ou sofrimento. Deve-se evitar levantar ou arrastar os animais pela cabeça, orelhas, cornos, membros ou cauda. O uso de aguilhões ou outros instrumentos pontiagudos também não são permitidos.
O transporte que inclui carga e descarga dos animais constitui uma das etapas que maior influência pode exercer no bem-estar animal. Carregar e descarregar animais num veículo automóvel são considerados os processos mais críticos do transporte por causa da forte interação homem-animal e da mudança de ambiente que leva ao stresse e dificuldade de condução dos mesmos. Assim, os meios de carga e descarga são de extrema importância no maneio dos animais, por isso as rampas e elevadores devem:
- Garantir a segurança e minimizar a agitação dos animais;
- Dispor de piso não escorregadio e de proteções laterais;
- Ter barreiras de segurança nas plataformas elevatórias;
- Ser construídas em material de fácil limpeza e desinfeção;
- Em ovinos e bovinos ter uma inclinação inferior a 26° ou 50%.
Apenas os animais que se encontrem saudáveis, em boas condições, devem ser transportados. A condição física do animal deve ser assegurada para que o transporte não lhe cause dor e sofrimentos desnecessários e que lhes permita suportar a duração da viagem. Os animais feridos ou que apresentem problemas fisiológicos ou patologias não podem ser considerados aptos para movimentação, nomeadamente, se:
- Forem incapazes de se deslocar autonomamente sem dor ou de caminhar sem assistência;
- Apresentarem uma ferida aberta grave ou um prolapso.
- No entanto, os animais que estiverem ligeiramente feridos ou que apresentem uma perturbação do estado geral que permita considerar que o transporte não lhes provocará sofrimento, podem ser considerados aptos.
- Na avaliação da aptidão para o transporte, devem ser sempre tidos em consideração os seguintes aspetos:
- A condição física do animal;
- A dificuldade de deslocação do animal. Deve-se avaliar o modo como se desloca, a sua postura e os sinais de claudicação;
- O tipo e gravidade do traumatismo, lesão ou doença do animal;
- A duração do transporte.
Critérios de avaliação da aptidão dos animais para transporte:
Animais Aptos
- Ligeiramente feridos ou com uma perturbação do estado geral que permita considerar que o transporte não lhes provocará sofrimento adicional;
- Suínos com menos de 3 semanas, vitelos com menos de 10 dias e borregos com menos de 1 semana, desde que a distância seja inferior a 100 Km.
Animais Inaptos
- Não pode ser transportado nenhum animal que não esteja apto a efetuar a viagem prevista, nem as condições de transporte podem comprometer a exposição do animal a ferimentos ou sofrimento desnecessário.
- Assim consideram-se animais inaptos todos aqueles que se encontrem nas seguintes condições:
- Sejam incapazes de se deslocar sem dor ou de caminhar sem assistência;
- Apresentem uma ferida aberta ou prolapso grave;
- Fêmeas prenhes com mais de 90% do tempo de gestação ou que tenham parido há menos de uma semana;
- Animais recém-nascidos cujo umbigo ainda não tenha cicatrizado completamente;
- Suínos com menos de 3 semanas, vitelos com menos de 10 dias e borregos com menos de 1 semana, sempre que a distância seja superior a 100 Km.
Abates de emergência
O animal ligeiramente ferido ou lesionado, se estiver apto para abate com destino ao consumo e simultaneamente apto para o transporte, deve ser encaminhado para o matadouro. Por se tratar de um animal ferido, cujo sofrimento importa minimizar e também para impedir que o seu estado se agrave, o que pode condicionar a aprovação da carcaça, é conveniente assegurar que seja abatido rapidamente, depois de chegar ao seu destino. Estes casos configuram um abate de emergência no matadouro.
O detentor do animal deve assegurar que o matadouro lhe autoriza a aceitação nas condições em que este se encontra. E a escolha do matadouro deve também ser feita com base no critério de maior proximidade possível da Exploração de origem.
Nas situações em que o animal saudável, ferido na sequência de um acidente na exploração, está apto a ser abatido para consumo, mas não está apto a ser transportado, o abate deve efetuar-se na exploração ou no local onde este se encontre, sem demoras, sendo enviado para o matadouro depois de abatido e sangrado. Estes casos configuram um abate de emergência fora do matadouro.
Tal como na situação anterior, o detentor do animal deve assegurar que o matadouro de destino receberá a carcaça do animal abatido, nas condições em que esta se encontra. O veterinário oficial do matadouro deve ser previamente informado acerca da chegada do animal abatido. Deve ser escolhido um matadouro situado o mais próximo possível da exploração, já que a duração do transporte do animal depois de abatido deve ser minimizada. Se decorrerem mais de 2 horas entre o abate e a chegada ao matadouro, o animal deve ser transportado num veículo refrigerado, exceto se a temperatura ambiente for inferior ou igual a 7°C.
Conclusão
O transporte de bovinos deve ser garantido e realizado sob ambientes calmos e confortáveis, sempre com maneio adequado ao comportamento padrão e natural dos animais, evitando a utilização de equipamentos inadequados, fraca manutenção dos veículos de transporte, condições climatéricas extremas (calor excessivo) e sem cais de embarque ou rampas excessivamente inclinadas. Estas situações negativas combinadas comprometem o bem-estar dos animais, devido à ocorrência de contusões, fraturas, arranhões, exaustão metabólica, desidratação e stresse térmico. Quando o destino dos animais é o matadouro, os principais problemas com as carcaças são as perdas de rendimento por alteração das propriedades organoléticas devido a presença de hematomas, além de alterações prejudiciais de pH da carne, com maior ocorrência de carnes desvalorizadas (PSE e DFD – carne escura, dura e seca).