
Perspetivas de curto prazo para os Mercados Agrícolas da UE em 2020
Destaque para o Mercado do Leite e dos Produtos Lácteos
A Comissão Europeia publica regularmente as suas perspetivas de curto prazo para os mercados agrícolas, sendo que no início de outubro foram conhecidas as previsões para o resto do presente ano e para 2021. Tendo em conta que já são considerados os efeitos da Pandemia COVID-19, reproduz-se de seguida um extrato desse documento, com particular destaque para o mercado do leite e dos produtos lácteos.
Esta edição de perspetivas de curto prazo para os mercados agrícolas da União Europeia (UE) é baseada nos dados obtidos até meados de setembro do presente ano e reflete, tanto quanto possível, o impacto da pandemia do COVID-19. As previsões foram efetuadas para a UE-27 e assumem um comércio sem atritos entre a UE e o Reino Unido em 2020 e 2021.
Neste texto daremos particular destaque ao mercado do leite e dos lacticínios, sendo que o documento original abrange a maior parte dos diversos segmentos da agricultura.
Apesar de menos afetado do que outros setores económicos da UE, o mercado agroalimentar também sofreu com a situação pandémica atual, principalmente devido à menor procura “fora do lar”, resultando naturalmente no menor consumo de alimentos.
Contudo, o impacto da crise no mercado alimentar foi relativamente contido, fruto da resiliência das cadeias alimentares. O padrão emergente parece ser o reforço de algumas tendências pré-existentes, como por exemplo o aumento do comércio eletrónico de bens alimentares, a maior procura de alimentos locais e o fortalecimento das cadeias de abastecimento curtas.
Neste contexto, a expectativa para 2020 permanece positiva: os preços dos lacticínios e da carne recuperaram da quebra sentida durante a fase aguda da pandemia do COVID-19; a recolha de leite aumentou e continua robusta. As exceções serão os cereais (principalmente o trigo) e o açúcar, ambos sofrendo de condições climatéricas adversas e/ou problemas de fitossanidade.
As incertezas para o futuro próximo estão relacionadas com a extensão e o impacto da 2.ª vaga da pandemia e do sucesso das medidas adotadas pelos governos de forma a mitigar as consequências económicas. Estes cenários tornam particularmente difíceis as previsões sobre a recuperação económica, o impacto na procura de alimentos e, em último caso, o desenho dos mercados agrícolas em 2021. A futura relação económica com o Reino Unido permanece incerta, sendo uma fator de variabilidade relevante para as presentes previsões.
Produção mundial de leite aumenta enquanto os preços na UE permanecem estáveis
A produção de leite está a aumentar nas principais regiões produtoras, apesar de um impacto significativo na procura, bem como as restrições de transporte e produção causadas pela COVID-19. Entre janeiro e junho de 2020, a produção dos EUA cresceu a uma taxa semelhante à da UE, a Austrália recuperou da quebra do ano passado, apresentando um crescimento na ordem dos +5% e as condições climatéricas que se verificaram na Argentina permitiram um aumento significativo da produção (+9%). A nova campanha na Nova Zelândia deve também beneficiar das boas condições climatéricas verificadas até ao momento.
Apesar do aumento da oferta global de leite, as cotações dos produtos industriais na UE permaneceram relativamente estáveis. O preço do leite em pó desnatado na UE fixou-se perto dos 2.150€/ t desde junho. A tendência de aumento do preço da manteiga na UE consolidou-se a partir de maio, atingindo cerca de 3400€/ t no início de setembro. Os preços do queijo e do leite em pó inteiro permaneceram estáveis durante o ano.
A recuperação do preço da manteiga na UE e a estabilização do preço do leite em pó desnatado reverteram a quedo no preço do leite pago ao Produtor na UE causada pelo surto de COVID-19. O preço do leite na UE atingiu perto de 31€/100 kg em agosto (2% abaixo do ano passado). O aumento sazonal do preço do leite na UE deve permanecer abaixo do homólogo do ano passado, devido ao aumento da oferta relativamente à frágil recuperação da procura.
Com condições climatéricas normais, a produção de leite na UE em 2021 poderá crescer a uma taxa modesta de (+0,8%), impulsionada pelo aumento da produtividade (+1,6%) e pela redução do efetivo leiteiro (-0,8%). O ritmo de produção permanece incerto, mas as altas taxas de crescimento de 2020 serão difíceis de manter no caso de uma lenta recuperação da procura.
Em 2020, o consumo de leite líquido sofreu uma inversão de desempenho, tendo a produção neste segmento aumentado +4% em relação a janeiro-julho do ano passado. O declínio estrutural no segmento de leite líquido estancou, sendo que em 2020 deverá ocorrer um aumento no consumo de +1,5%. No período janeiro-junho as exportações da UE aumentaram 3%, impulsionadas principalmente pelo mercado chinês (+ 17%). Esta tendência deve ser reforçada no final do ano, levando a um aumento geral das exportações de produtos lácteos frescos (FDP) em 2020 (+ 8%).
Em sentido oposto, a produção de natas e iogurte deverá diminuir -0,5% em 2020. Isto deve-se a uma competição pelo uso de gordura do leite e pela redução no consumo doméstico, não totalmente compensadas pelas vendas no comércio e pelo aumento das exportações. Em janeiro-junho, as exportações de natas para a China (36% das exportações de natas da UE) cresceram 40% e o iogurte exportado para o Reino Unido (65% das exportações de iogurte da UE) aumentaram 7%.
Em 2021 não são esperados os comportamentos que levaram à criação de stocks domésticos por parte dos consumidores no início da pandemia de COCID-19. Assim, o consumo apresentará uma tendência de decréscimo (-0,4%), levando a uma redução na produção. As exportações devem crescer ainda mais (5%), impulsionado por uma imagem positiva dos produtos lácteos frescos da UE.

Figura 1. Variação mensal na produção de Leite em países selecionados – Adaptado de DG Agriculture and Rural Development, based on AHDB
Projeções do mercado da UE: Leite e Produtos Lácteos
No verão, a falta de chuvas e as temperaturas acima da média dificultaram o desenvolvimento das pastagens no norte da Alemanha, oeste da Polónia, nordeste de França e nos países do Benelux. Ao contrário, as condições meteorológicas foram mais favoráveis na Europa Central, bem como na Península Ibérica. Estas condições podem ter um impacto negativo na disponibilidade de alimentação animal durante os próximos meses, contribuindo dessa forma para o abrandamento do crescimento da produção de leite no final do ano.

Figura 2. Projeções do mercado da UE: Leite e Produtos Lácteos
A recolha de leite na UE deve apresentar um crescimento na ordem dos 1,4% em 2020, em consequência das condições favoráveis de pastagem até julho, bem como dos preços acessíveis das rações. Simultaneamente, o efetivo leiteiro deverá recuar -0,4%, com o aumento do abate na segunda metade do ano.

Figura 3. Leite recolhido por mês na UE (1000 ton) – Adaptado de DG Agriculture and Rural Development, based on MS notifications and Eurostat
A exportação sustentará a produção de leite em pó na UE
Os preços competitivos na UE do leite em pó desnatado, leite em pó inteiro e manteiga continuam a impulsionar as exportações. As exportações de leite em pó desnatado da UE deverão atingir o segundo valor mais alto da história (850 000 t), enquanto o processamento interno deverá regredir para níveis de 2017. Isto levará a um aumento de produção de 5% em 2020, seguido por um crescimento de 3% em 2021, impulsionado por uma crescente procura das exportações e pelos preços acessíveis.
Em janeiro-junho, as exportações de leite em pó inteiro da UE continuaram a crescer (+ 12%), principalmente para a África (+ 53%), enquanto as exportações para o Próximo e Médio Oriente, os maiores mercados de exportação da UE, diminuíram 1%. Apesar de um aumento da concorrência por parte da Nova Zelândia nos próximos meses, os preços competitivos da UE deverão permitir que as exportações da UE permaneçam estáveis.
Em 2021, as disponibilidades mundiais e uma substituição crescente de leite em pó inteiro por outros leites em pó, provavelmente, reduzirão as exportações da UE (-2%), resultando numa queda na produção (-0,5%).
Apesar do aumento do preço da manteiga na UE, as exportações estão a crescer e eventualmente atingirão um recorde em 2020 (320 000 t). As perdas sentidas no mercado de alimentação “Fora do Lar” serão compensadas pelas vendas no retalho, estabilizando o consumo interno. Em 2021, serão efetuados mais ajustes no mercado alimentar e nos canais de retalho (ex. mais restaurantes a trabalhar com takeway e comércio eletrónico) pelo que o consumo na UE aumentará +0.4% e as exportações da UE provavelmente manter-se-ão competitivas. O crescimento da produção deverá rondar +1%.
Exportações de queijo na UE também deverão crescer em 2021
O consumo de queijo na UE está a ser prejudicado pelos constrangimentos na restauração, sendo esperada numa queda em 2020 de -0,2%. A procura global por queijos da UE permanece elevada, com o aumento das encomendas para o Japão, Suíça, Coreia do Sul e Ucrânia, compensando as perdas no mercado americano. As exportações da UE devem crescer 5%, apoiadas por um aumento de produção de +0,7%. Em 2021, ajustes nos canais da restauração e Retalho deverão ajudar a que o consumo de queijo na UE possa crescer 0,5%. Combinado com o aumento das exportações da UE, a produção deverá aumentar +0,5%.