O Elogio do Leite

 

O leite é um alimento completo para o bebé. No entanto, também se pode dizer que preenche grande parte das necessidades do adulto.

Algumas vozes que falam contra o leite dizem que, nos outros animais, nenhum mamífero adulto recorre ao leite como alimento. Esse é um raciocínio simplista.

A verdade é que nenhum dos outros mamíferos (salvo os animais domésticos) foi capaz de, através de melhores condições sanitárias e de combate às infeções através de antibióticos, aumentar a esperança de vida como fez o ser humano. Em Portugal, há um século, a esperança de vida era metade da atual. Com esse panorama, o problema da osteoporose da segunda metade da vida atual, quase não existia. Morria-se antes de tuberculose, pneumonias, “febres intestinais”. E a verdade é que, sobretudo nos centros urbanos, o leite era um bem escasso, que se reservava para as crianças, se e quando possível.

O leite contém duas substâncias muito importantes para a vida – as proteínas e o cálcio. As proteínas fazem parte da estrutura do nosso corpo, são o cimento, os tijolos. As proteínas de origem animal, como é o caso das do leite, são completas em aminoácidos essenciais, ou seja, aqueles que o nosso corpo não consegue sintetizar por si próprio e tem que ir buscar à alimentação. Em relação ao cálcio, é o alimento mais rico. Claro que há outros alimentos que contêm cálcio, como a couve galega. Mas temos que comer 100 gr de couve galega cozida, e bem escorrida, para obtermos a mesma quantidade de cálcio que um copo de leite. E é complicado andarmos a comer couve galega três vezes por dia, ao passo que é fácil ingerir lacticínios três vezes ao dia. E o leite também tem fósforo, magnésio, potássio.

É importante notar que em relação a estas substâncias – proteínas, cálcio, fósforo e magnésio – o conteúdo é o mesmo no leite gordo, meio-gordo ou magro. Estes só diferem na percentagem de gordura.

Esta possibilidade de ingerir leite meio gordo ou magro, mantendo as suas qualidade nutricionais faz do leite e do iogurte, alimentos excelentes para um regime de emagrecimento, pois são os alimentos com pouca densidade calórica e ideais para os lanches ou snacks intercalares. O facto de terem hidratos de carbono em pequena quantidade e poderem ser produzidos com pouca ou quase nenhuma gordura, faz do leite e dos iogurtes, alimentos com muito valor nutritivo, mas baixos em calorias. Por outro lado, dão saciedade e não provocam fome de ressaca, uma hora, a hora e meia depois, como acontece com os alimentos que sendo ricos em açúcar resultam num pico glicémico alto.

“Claro que há outros alimentos que contêm cálcio, como a couve galega. Mas temos que comer 100 gr de couve galega cozida, e bem escorrida, para obtermos a mesma quantidade de cálcio que um copo de leite. E é complicado andarmos a comer couve galega três vezes por dia, ao passo que é fácil ingerir lacticínios três vezes ao dia. E o leite também tem fósforo, magnésio, potássio.”

Intolerância ao Leite?

Coloca-se também o problema da moda da “intolerância” ao leite que passou a ser epidemia…

Ora só tem intolerância ao leite que não tiver uma enzima, que é a lactase, para desdobrar a lactose, o açúcar do leite. Na origem dos povos que foram migrando na Europa e no mundo houve os que se dedicaram ao pastoreio, enquanto outros ainda viviam da caça, da pesca e da colheita de frutos e sementes.

Os povos do pastoreio foram sendo selecionados como bons aproveitadores de leite e portanto portadores da lactase. Entre os outros essa seleção não se deu nem foi necessária. E os povos foram-se misturando… Por isso alguns seres humanos ainda não têm lactase suficiente e por isso têm intolerância à lactose. É fácil saber se há intolerância porque há um teste que se realiza, idêntico ao da tolerância à glicose, para ver se uma pessoa é diabética. E assim se tiram as dúvidas. E modas… E para quem tem mesmo intolerância à lactose, pode recorrer aos iogurtes, porque nesses a lactose transforma-se em ácido láctico e deixa de estar presenta. O que não podemos é deixar substituir o leite por líquidos a imitar o leite. A bem da nossa saúde.

ISABEL DO CARMO, Professora da Faculdade de Medicina de Lisboa