Expressão de outros comportamentos em bovinos
As vacas devem ser capazes de expressar comportamentos normais, ou seja, deve ser possível revelarem comportamentos naturais específicos da espécie, como o acesso ao pastoreio ou aos parques ao ar livre.
O acesso à pastagem para vacas leiteiras é altamente valorizado tanto pelos animais, assim como pela sociedade em geral. Quando o acesso à pastagem não é possível ou viável, os Produtores podem fornecer às vacas formas alternativas de acesso ao ar livre, como existem em muitas Explorações leiteiras os parques exteriores em terra batida, que podem ser mais facilmente implementados.
Ao realizar uma breve revisão da literatura existente, rapidamente, se verifica que os comportamentos de deitar, ficar em pé, andar, alimentar-se, sociais e de cio são influenciados pela pastagem e outros tipos de espaços ao ar livre. O acesso ao prado permite a realização do pastoreio natural e pode facilitar a expressão dos comportamentos mencionados anteriormente. Além disso, pode diminuir o número de interações sociais negativas entre vacas, provavelmente, porque existe mais espaço por vaca, ou seja, menor densidade animal comparativamente ao interior do estábulo. A existência de piso macio e parques ao ar livre parece desencadear alguns benefícios para os comportamentos de descanso, facilita a locomoção e também pode ter efeitos positivos no comportamento social, especialmente em espaços com maiores áreas disponíveis. Também existem evidências que documentam maior facilidade na deteção de comportamento de cio, quando as vacas frequentam espaços ao ar livre. Como a preferência das vacas pelo acesso ao exterior depende de muitos fatores, deixar que os animais livremente façam essa escolha, pode ser de particular importância.
Panorama na Europa
A tendência geral na maioria dos países europeus na produção convencional de leite é para uma diminuição das Explorações com possibilidade de acesso à pastagem por parte das vacas leiteiras. A exceção resume-se a alguns países Nórdicos, como Suécia, Noruega e Finlândia, que implementaram regulamentos onde exigem que as explorações disponibilizem o acesso à pastagem durante períodos específicos. Por exemplo, na Suécia as vacas leiteiras devem ter acesso ao prado por um período mínimo de 6 horas ao dia durante pelo menos 2 a 4 meses no ano, dependendo da região. Esses regulamentos são baseados no pressuposto de que o prado permite às vacas usufruir de um ambiente que lhes possibilita expressar adequadamente os comportamentos naturais, incluindo fazer pastoreio. Da mesma forma que o acesso à pastagem, a frequência de Explorações na Europa que utilizam áreas externas alternativas é muito reduzida. A única informação científica disponível resulta de um estudo da EFSA (Autoridade Europeia de Segurança Alimentar) do seu painel de saúde e bem-estar animal num relatório científico publicado em junho de 2015 sobre a temática: “Avaliação de bem-estar das vacas leiteiras em sistemas de exploração de pequena escala”, onde ficou evidenciado que 3 das 124 Explorações da amostra estudada afirmaram que dispunham de uma alternativa ao ar livre para os seus animais.
Preferência e motivação das vacas pelo acesso ao exterior
Num estudo realizado por nós em 2012, no qual foram inquiridas 82 Explorações leiteiras da região Norte de Portugal, observou-se que 35% possuíam parque ao ar livre, normalmente em terra batida. Segundo a EFSA (2009), o recurso a parques exteriores melhora a saúde das úngulas e favorece a sua resistência quando os animais são submetidos a pisos traumáticos, além do seu benefício para o exercício físico.
A preferência pela pastagem é muito influenciada pelas condições climatéricas, como sejam a temperatura, precipitação, vento e o índice temperatura-humidade (ITH), pois quando as condições são mais adversas verifica-se uma diminuição do tempo despendido no exterior do estábulo ou em pastoreio.
Efetivamente, as vacas demonstraram maior preferência pelo acesso à pastagem durante a noite, possivelmente para evitar as elevadas radiações solares que se fazem sentir no período diurno, principalmente nas estações do ano mais quentes, como a Primavera e Verão. Também foi demonstrado que a distância da pastagem afeta a sua utilização durante o dia, mas não à noite, o que é coincidente com uma maior motivação das vacas para recorrer à pastagem no período noturno.
Existe igualmente evidência de que as vacas passam pouco tempo ao ar livre no Inverno e apenas despendem 5% desse tempo deitadas. A qualidade do ambiente interno do estábulo também pode influenciar a predisposição de acesso ao ar livre dos animais, nomeadamente, a densidade animal, a frequência de remoção de dejetos, o adequado arejamento e o nível de gases presente nas instalações. A existência de número suficiente de cubículos, assim como o tipo de superfície também demonstrou exercer uma forte influência sobre a preferência das vacas pelos espaços interiores, principalmente durante os períodos de descanso. Não sendo possível manter as vacas na pastagem (meio natural) e observando-se algumas desvantagens importantes nos sistemas de estabulação livre em parques (higiene), os cubículos são, atualmente, o sistema de estabulação mais recomendado. O cubículo deve ser idealizado tendo em conta a morfologia, tamanho e peso dos animais a alojar, proporcionando um confortável local de descanso, onde se possam deitar e levantar confortavelmente e sem dificuldades na mobilidade.
Quando alojadas em estábulos, as novilhas exibiram um aumento significativo de interações agonísticas, com maior agressividade comparativamente a animais com acesso ao prado.
Num estudo em que foi possível contabilizar o tempo despendido pelas vacas com acesso exterior a dois tipos de recursos, observou-se que os animais passaram muito mais tempo na pastagem (90%) comparativamente ao parque exterior em areia, que foi de 44,4%. As vacas passaram cerca de 54% do tempo deitadas quando estavam ao ar livre, e esse valor não diferiu entre as duas opções, pastagem ou areia. Este resultado sugere que dispuseram de duas superfícies igualmente confortáveis para se deitarem. Também se constatou que passaram menos tempo empoleiradas no cubículo (“perching” – carateriza-se pela postura das vacas em pé com as patas dianteiras posicionadas no cubículo e as patas traseiras no corredor do estábulo) durante o dia, quando dispunham de acesso ao exterior, quer fosse pastagem ou simplesmente parque ao ar livre, comparativamente à inexistência de recurso exterior. Menos tempo gasto em “perching” pode ser benéfico para a saúde das vacas, já que este comportamento indesejável está muito relacionado com problemas de claudicação.
Alguns especialistas alegam que as vacas podem sentir-se inseguras ao manifestar os comportamentos de cio, quando se encontram estabuladas em piso de cimento. Este tipo de piso, regularmente utilizado nos corredores das explorações, foi associado a mais escorregadelas durante a monta em comparação com o pasto ou piso de borracha. O piso de cimento também contribui para maior risco de claudicação em vacas leiteiras, por isso o acesso a uma área externa com melhor apoio do que o garantido pelo cimento pode ser especialmente benéfico para deteção de sinais de cio nas vacas.
Avaliação do indicador
No momento de avaliação deste indicador, se houver área de pastagem disponível, o Produtor é interrogado sobre o maneio da mesma. A classificação deste parâmetro é realizada em função do número de dias em que os animais dispõem de acesso à pastagem por ano e número de horas por dia.
É considerada a percentagem de dias por ano em que as vacas usufruem de pelo menos 6 horas de pastagem. De seguida apresenta-se um gráfico padrão retirado do referencial “Welfare Quality®” (2009) onde é possível observar a pontuação em função dos dias em que as vacas realizam pastoreio.
Áreas externas alternativas avaliadas até ao momento parecem ser menos atraentes relativamente ao prado, porque não concedem a oportunidade de fazer pastoreio direto pelos animais. De qualquer forma, não é desejável que os animais estejam confinados a espaços fechados com piso de cimento, identificado como elevado fator de risco para claudicação, e por vezes, com elevada densidade animal, o que dificulta a liberdade de movimentos das vacas, agudizando-se os problemas quando os pavimentos são escorregadios e abrasivos.
Figura 1. Cálculo das pontuações para a expressão de outros comportamentos de acordo com a proporção de dias por ano em que as vacas acedem à pastagem.
Conclusão
As vacas demonstraram preferência em passar a maior parte da noite ao ar livre, quando tiveram essa oportunidade, perante condições meteorológicas relativamente amenas. A preferência pelo acesso ao ar livre foi maior para o recurso ao prado de grandes dimensões comparativamente aos parques exteriores de área limitada.